sexta-feira, 14 de março de 2008

Hipocrisias

Os portugueses têm, em relação aos professores, a mesma hipocrisia que os americanos têm em relação aos políticos.
Pergunte-se a qualquer português o que faria se tivesse uma pipa de massa e ele responde logo: «deixava de trabalhar». A «ética» do trabalho em Portugal consiste em considerar que o trabalho é um mal infelizmente necessário, que deve ser feito da forma mais automática e acéfala possível, e, se possível, explorando o mais que se possa quem nos paga. (Acrescento que deve ser do ar ou da água, porque, em saindo do país, os portugueses não são piores trabalhadores do que os outros povos e adquirem rapidamente a ética de trabalho vigente no país onde se encontram.) Mas todos guardam da escola a ideia de quando lá estiveram como alunos e não lhes passa pelas mentes que ser professor não é chegar à sala de aula e dizer umas larachas ou escrever uma coisas no quadro, nem que enquanto os meninos estão em casa os professores continuam na escola.
Não deve haver um ser humano que nunca tenha tido a sua calinada, a sua escorregadela freudiana, o seu pontapé na gramática, mormente em frente de um microfone. Mas os professores, apanhados no meio de uma manifestação, têm a obrigação de falar como misturas de Camões e Padre António Vieira condensadas numa só pessoa, ou então são uns alarves.
Os portugueses ganham mal. Com excepção dos gestores, sobretudo os de empresas públicas, dizem os jornais. Por isso, os portugueses são grandes praticantes de actividades paralelas. Mas os professores não podem (e quem conhece algum que arredonde o ordenado com umas aulitas extra num colégio ou com meia dúzia de explicações chama-lhe de bandido para cima) – talvez por isso atribuem-se-lhes imaginários ordenados chorudos. Tendo em conta que os professores são na sua maioria licenciados e mestrados, ganham mal. Mas nem é disso que se queixam, só que o português nem ouve.

Já lá vai o tempo em que os pais davam a educação e a escola a instrução. Agora, o português médio quer que a escola (leia-se os professores) lhes eduquem os filhos, lhos instruam, ou pelo menos que os passem todos os anos, que tomem conta deles, que os ensinem a comer com garfo e faca, a andar na rua, a consumir com inteligência, a não engravidar (se são raparigas) antes dos vinte anos, a estudar e a fazer os trabalhos de casa, a compreender as leis, etc, etc, etc – e botem etc nisso! - e ainda se escamam porque a escola não os guarda nas férias, nem nos fins-de-semana nem à noite. Os anjinhos dizem palavrões que fariam corar um carroceiro (tenho alunas de doze anos que usam f***-se como vírgula nas conversas), arrotam ou soltam gases intestinais nas aulas, vêem muitas vezes às aulas de mãos a abanar, sem um caderno, sem um livro, sem um lápis ao menos, falam em voz alta com o colega que está no outro canto da sala, atendem o telemóvel, copiam pelo caderno de um amigo o trabalho de casa de outra disciplina, nem sequer percebem se ralharmos com eles, porque não vêem o que estarão a fazer de mal, e se chumbarem no fim do ano a culpa é do professor, certo?
Há maus professores? Há. E maus canalizadores, e maus ladrilhadores, e maus advogados, e maus médicos, e maus políticos, e maus padres, e maus padeiros, e maus cozinheiros...
Se todos os professores fossem tão maus como o Ministério da Educação os tem pintado, já as escolas tinham caído há muito tempo, já havia mais meninos a bater nos pais e mais violência em geral.
Nenhum grupo de pessoas aceita ser assim caluniado e odiado por aqueles cujos filhos educa. É de mais!
É que os professores são gente e também se cansam,
consegue perceber?
Quanto à estafada história do cheque educação, vá ver os resultados que deu onde foi adoptado. E saiba que nunca o ensino privado aceitará voltar a ser tutelado e certificado pelo estado - o que fará com que o ensino privado que esta «nova» esquerda (cuja a novidade consite, ao que me tem sido dado ver, em parecer-se com a direita) tanto defende vá, no futuro, formar aqueles que hão-de engolir este regime. Posso já cá não estar para ver, mas não duvido de que acontecerá.

quinta-feira, 13 de março de 2008

terça-feira, 11 de março de 2008

Quem quer pegar, pega por tudo

Ali em baixo já mostrei como o meu horário está preenchido. Claro que haverá sempre quem diga que não, que é só chegar à sala de aula e dizer umas coisas.
Acrescento que o horário do colega que terá que me avaliar é exactamente igual. Em que horário irá ele assistir às 5 aulas (2 este ano e mais 3 no ano que vem)? E se nos lembrarmos de que são 5 minhas e outras 5 de cada uma das 12 pessoas do departamento? Sessenta aulas assistidas é obra!
Para ele ajuizar se cumpri as planificações, terei que lhas entregar, certo? Eu e mais 12 pessoas. Eu, por exemplo, tenho um caderno por turma – quatro cadernitos só à minha pala. Multipliquem por 12 - e eu nem sou das pessoas mais picuinhas, há quem tenha planificações detalhadas aula-a-aula, umas 120 aulas por turma/ano.
Para comparar as classificações que eu propus (e apenas propus, pois segundo a legislação vigente o professor apenas propõe as classificações, e a responsabilidade é do Conselho de Turma – alguém já pensou nisto?) com as médias do ano anterior elas têm que estar diponíveis. As da escola e as nacionais. Isto dá trabalho… Quem é que o faz?
Vamos a que o desgraçado do coordenador tenha tudo pronto no final do próximo ano. A «minha» escola tem perto de 100 professores. Alguém está a «ver» as 100 resmas de papelada na frente do Presidente do Conselho Executivo? Ou do Director? Será que ele as vai ler, detalhadamente? Nos intervalos de quê?
Isto já foi experimentado em algum lado? As condições eram as mesmas? Funcionou?
Alguém sabe?

Às 7 da noite...


... estes colegas ainda iam a meio da Rua do Ouro. Comunistas mal informados e manipulados, sem dúvida...

sexta-feira, 7 de março de 2008

Balhamedeus!

Na TSF está em curso um fórum sobre a contestação à poltíca da Educação. Vale a pena ouvir...!

terça-feira, 4 de março de 2008

Só para esclarecer...

Este é o meu horário deste ano. Peço desculpa pela pequenez das imagens, mas ainda sou novata nisto de inserir imagens aqui!
Como tenho mais de45 anos, ainda beneficiei de 4 horas de redução por idade na componente lectiva (com o novo estatuto, essa redução apenas acontecerá aos 55anos).



A azul, estão assinaladas as horas de aulas e as que são legalmente equiparadas a aulas – a Direcção de Turma e a reunião semanal de conselho de turma do CEF.
A rosa, assinalei as horas «não lectivas».
A cinza assinalei as horas em que posso, efectivamente, trabalhar na escola, para além do horário - desde que a sala de trabalho dos professores não esteja ocupada e haja computadores livres e a funcionar. Também posso ficar na sala de professores a trabalhar se houver um portátil livre ou se tiver coisas para escrever à mão ou para ler e corrigir.
A vermelho assinalei as horas em que podem decorrer reuniões em tempo de aulas. É verdade que não há reuniões todas as semanas, mas há semanas em que tenho 3 reuniões.

Vamos agora imaginar que, para cada tempo de aula, eu, que já tenho uma experiência razoável (sou professora há 23 anos), precise de outro tanto para a preparação e assinalemo-lo a verde:




As «horas não lectivas» são preenchidas com apoios. Num deles chego a ter 12 alunos. Nos outros tenho 3 num, 3 noutro e 1 noutro. Qualquer deles exige preparação – vou esclarecer dúvidas, fazer trabalho prático que, por vezes, não pode ser feito na aula por falta de tempo, vou explicar matéria a alunos que têm dificuldades e tudo isto tem que ser preparado. Como sou uma professora experiente, coloquemos lá 45 m de preparação por cada 45 m de apoio – e é pouco… - assinalados a roxo:


A tutoria é o acompanhamento a um aluno cujo comportamento é problemático. É frequente que tenha que pesquisar, que preparar actividades, mas vamos imaginar que não.
A reunião semanal do Conselho de Turma do CEF exige preparação: tenho que terem ordem o dossier da turma, contactar os Encarregados de Educação (que são mais difíceis de encontrar, às vezes, do que o Presidente da República!) – o que faço nas horas de Direcção de Turma, além do registo informático das faltas e respectivas justificações, bem como a comunicação das mesmas aos referidos Encarregados de Educação. Vamos supor que o tempo semanal de Direcção de Turma chegue – que raramente chega…

A hora de Trabalho do Departamento tem MESMO que ser preparada. Como tenho dois níveis (e sou uma felizarda, porque há quem tenha até 5), reúno com dois colegas – com um tenho em comum o 8º ano, com outro o 7º, para aferir critérios, comparar progressões e dificuldades, elaborar planificações conjuntas ou até partilhadas, etc… Imaginemos que tenho que trabalhar 90 m por semana para essas reuniões – de novo porque já sou velha experiente. Assinalo-as a laranja:


Falta ainda a correcção de trabalhos dos alunos, sobretudo testes, mas também fichas, textos e pesquisas, que são demasiado longos para ser corrigidos nas aulas. Como tenho perto de 60 alunos – e sou uma privilegiada, pois tenho três turmas reduzidas, já que têm alunos com Necessidades Educativas Especiais, além de que, sendo professora de Língua Portuguesa, tenho 4 tempos semanais com cada turma. O ano passado, tive um colega de Informática que tinha 13 turmas e este ano tenho uma colega com 10 turmas (a 22 alunos, mais ou menos, por turma, façam as contas ao monte de testes ou de trabalhos) – vamos a que dedique 90 minutos semanais a esta tarefa, assinalados a preto:



Mas o meu Ministério espera que eu me mantenha em formação ao longo da vida. Para isso dá-me dispensa das «horas não lectivas». Como necessito de me deslocar, no mínimo até à cidade mais próxima (uns 15 m de carro) e voltar (outros 15 m de carro) estou um bocado limitada.

Vamos agora ao ano lectivo:



A azul, tenho os períodos de aulas. A laranja, as reuniões de avaliação. A laranja mais carregado o trabalho de formação de turmas, horários, matrículas. A branco e a cinza, estão os períodos de férias, deixando claro que, nos assinalados a cinza o professor pode ser chamado à escola e é obrigado por lei a apresentar-se – embora, normalmente, isso (o ser chamado) não costume acontecer.

Tudo o resto – que os professores trabalham 12horas por semana ou que têm 4 meses de férias – são mentiras estúpidas e mal intencionadas, propaladas por quem tem interesse em denegrir a imagem dos professores ou por quem fala do que não sabe e imagina, por exemplo que, quando os meninos estão em casa, os professores também estão.
Quanto ao desgaste que a profissão implica, proponho um simples exercício para quem tem filhos. Ao fim de uma semana de férias com dois filhos adolescentes em casa, como se sentem? Multipliquem os filhos por dez, a semana por trinta e acrescentem-lhe o agravamento acrescido – quando finalmente crescem e abandonam a «idade do armário», são substituídos por uma nova fornada de adolescentes na «idade do armário».